O advogado e professor doutor da Universidade de São Paulo, Alysson Mascaro, concedeu entrevista, ao SindJustiça Ceará, após palestra proferida no XII Congresso da Fenajud
SindJustiça-Ce: Alysson, explica melhor esta fala sobre algumas categorias de trabalhadores, como a do Judiciário, terem mais dificuldades para se reconhecerem como classe.
Na sociedade capitalista, todas as classes de trabalhadores são constituídas pela ideologia do capital. Algumas, mais patentemente, fazem com que o seu trabalhador não reconheça a sua condição de trabalhador. Os servidores do Judiciário e alguns trabalhos de classe média impedem uma percepção da condição de trabalhador. Mas, tecnicamente, até o trabalhador daquelas profissões que são, reconhecidamente, profissões da exploração mais básica, eles também têm desejos de escapar da condição de explorado e passar à condição de explorador. É um problema ideológico geral que se exemplifica, eventualmente, de modo mais incisivo no Judiciário, mas não é exclusivamente dos trabalhadores do Judiciário.
SindJustiça-Ce: E o que fazer diante desta situação?
É preciso lutar por uma espécie de estrutura geral da classe trabalhadora, de mobilização ideológica. É preciso fazer a batalha das ideias. Essa batalha não é exclusividade da base do Poder Judiciário. Deve haver uma união geral de vanguarda de todas as atividades dos trabalhadores do Brasil para que nós possamos fazer uma mobilização geral para todas as profissões. Afinal, muito do que envolve a própria condição da servidora e do servidor do Judiciário não é exclusividade do problema da servidora e do servidor do Judiciário. É uma questão geral da classe trabalhadora brasileira. Eu gostaria muito que a Fenajud, que este Congresso e todas as lutas do movimento sindical dos servidores do Judiciário pudessem avançar no sentido de liderar uma vanguarda de luta social pela superação do capitalismo para todas as bases e categorias, para todos os trabalhadores e desempregados do Brasil.
SindJustiça-Ce: Você afirma que o Judiciário, as leis em geral, servem ao capital; servem a uma organização econômica-social que é opressora. É possível superar esta condição?
Sim, porque o sistema é a sociedade capitalista. Ela é histórica, ela não é eterna e nem é da natureza. Então, a possibilidade de superar as contradições do Direito é a possibilidade de superar o capitalismo. Se nós começarmos a reconhecer que o capitalismo é o problema, e socialismo é a solução, nós começamos a diagnosticar, corretamente e concretamente, o problema, para que saibamos qual é o verdadeiro problema e qual é o verdadeiro método de transformação social. Daí, começamos a apontar a solução, e ficará mais fácil que, no futuro, a sociedade se mobilize.
SindJustiça-Ce: Que desafios você percebe para o movimento sindical dos servidores do Judiciário neste Brasil de Moro e Dallagnol?
É heroica a possibilidade de resistência, de lideranças sindicais dos trabalhadores do Judiciário, dado o reacionarismo e o conservadorismo patentes da maioria dos que operam a máquina judiciária. Então, em primeiro lugar, minha recomendação de muito afeto, para que se cuidem e se apoiem reciprocamente, e que tenham energia e entusiasmo mesmo em tempos de tristeza e de dor. Mas acima disso, para que tenham também entusiasmo de não apenas viver uma vida sindical reativa, ou seja, resistindo ao momento presente da sociedade brasileira. Mas que possam ir ao ataque e que para isso encontrem o povo, esclareçam o povo, porque, assim, o povo fará pressão também nas bases do Poder Judiciário. Então, será o povo que levará a mobilização, que ajudará aos trabalhadoras e trabalhadores do Judiciário. A pressão popular será fundamental.
SindJustiça-Ce: Como fica esta moda de integrantes do MP e do Judiciário, melhor, de ex-integrantes, saindo como candidatos?
No imediato de possibilidades de incremento da ação política institucional no Brasil – sem falar em termos de transformação, de ruptura –, nós temos um descalabro, inclusive institucional, que é a possibilidade de elementos que têm poder institucional, venham agir em termos de decisão judicial, e logo em seguida, possam receber o proveito político-eleitoral dessas mesmas decisões. Então, eu penso que no imediato deveria haver um bloqueio bastante amplo na estrutura da ação política desses agentes, impedindo-os, por um longo espaço de anos, da disputa de cargos eleitorais. Penso até que é algo fácil, de entendimento relativamente imediato da maioria das pessoas e deveria ser uma pauta imediata; destas que nos serviriam para tirar a teia de aranha, para depois, fazer a crítica estrutural do mundo jurídico.
SindJustiça-Ce: Na palestra, durante o XII Conseju, sua fala foi bem cortês, educada, bem-humorada até. Mas foi também bem direta, e eu diria até dura. O que você pretendeu alcançar com este tom?
A sociedade capitalista conseguiu constituir a subjetividade de todas e todos nós, na ideologia, de tal modo que nós somos praticamente blindados a jamais escapar da lógica e da intelecção de mundo do capital. Por causa disso, não adianta que, no tempo presente, nós venhamos a nos iludir, que palavras edulcoradas – que eventualmente servem para um movimento imediato – consigam calar fundo em nós mesmos. Então, no mundo que é só trevas, é preciso uma pancada da verdade contra essas trevas. Mas ela é a maior prova de amor no desejo da esperança e da transformação desse mundo.
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